Leitura: Jo 2,1-12
Vamos contemplar este mistério a partir
de cinco idéias.
1. As bodas de Caná, na narrativa de
São João, são imagem da consumação da aliança entre Deus e o seu povo,
consumação acontecida precisamente em Jesus, o Messias de Deus. Muitíssimas
vezes no Antigo Testamento, a aliança entre Deus e Israel fora comparada a um pacto
matrimonial: Deus é o esposo fiel, Israel é a esposa, tantas vezes infiel,
prostituindo-se na idolatria. Assim, diante do fracasso da antiga aliança, Deus
promete que fará uma aliança eterna com um resto. Seria uma aliança espiritual,
nova e eterna. O Messias, com a sua vinda, haveria de selar tal aliança. Pois
bem, Caná é imagem dessa nova realidade. Chegaram as núpcias da nova aliança.
Jesus é o esposo, o próprio Deus que vem desposar o novo Israel, a Igreja, sua
esposa. Aí, a Igreja, a Mulher, é representada pela Virgem Maria. Daí Jesus
chamá-la “Mulher”! Assim, contempla-se aqui a fidelidade amorosa do Deus de
Israel, que cumpre sua promessa de uma aliança nova e eterna e vem desposar
Israel, sua esposa.
2. Estas núpcias, prenunciadas em Caná,
somente na Páscoa (morte e ressurreição) do Senhor é que iriam consumar-se. O
evangelho insinua isso quando afirma: “No terceiro dia houve núpcias... e
Jesus manifestou a sua glória... e seus discípulos creram nele” (Jo 2,1.11b).
Isto que aqui é prenunciado, na ressurreição será realizado: ao Terceiro Dia,
dar-se-ão as núpcias do Cordeiro (cf. Ap 19,7), quando o Ressuscitado mostrou a
sua glória e seus discípulos creram nele! Então, pode-se contemplar neste
mistério a união fiel e amorosa entre Cristo e a sua Igreja numa nova e eterna
aliança de amor, que começou neste mundo com a morte e ressurreição do Esposo e
será plena, um Dia, na glória dos céus. Até lá, a Esposa, ansiosa e
amorosamente, caminha exclamando ao Esposo: “Vem!” e ele, fielmente
responde: “Sim, venho em breve!” (Ap 22,17.20).
3. Ainda digno de contemplação é a água
que enchia as talhas usadas para a purificação ritual segundo a Lei dos judeus
transformada no vinho novo e bom, sinal do dom do Espírito, Nova Lei da nova e
eterna aliança. É o que Jesus, o Ungido do Pai veio nos trazer: a nova aliança
no Espírito Santo, Espírito que embriaga e nos dá a perene alegria de Deus (cf.
Ef 5,18).
4. Outro ponto para a meditação é o
papel exercido pela Mãe do Senhor: “A Mãe de Jesus estava lá” – em Caná
e ao pé da cruz (cf. Jo 19,25); estará também com o fruto da Páscoa, da Hora de
Jesus: a Igreja nascente, no Cenáculo de Jerusalém (cf. At 1,12-14). É
importante compreender isso: a Virgem Mãe nunca é o centro. Centro da nossa fé,
centro da nossa salvação é somente o Senhor Nosso Jesus Cristo. Centro de nossa
fé é a sua Páscoa: paixão, morte e ressurreição. E, no entanto, em ser o
centro, a Virgem sempre está no centro, isto é, sempre está ali, no momento
pascal do Senhor, no momento-chave da nossa salvação! Assim contemplemo-la como
ministra (servidora) na obra salvífica de Cristo! Ela é não somente nossa Mãe
na ordem da graça como também é modelo de serviço e cooperação na obra
salvífica de Cristo.
5. Um último ponto para nossa
contemplação é o papel de intercessão de Nossa Senhora. Em Caná ela vê a
necessidade dos noivos e intercede; sua intercessão é toda obediente, toda de
escuta à palavra de Jesus e de plena conformidade com sua vontade. Assim, ela
mesma nos ensina a fazer sempre a vontade do Senhor: “Fazei tudo o que ele
vos disser!” E, num dos momentos mais impressionantes do Novo Testamento,
que deixa confusos até os estudiosos mais eruditos, a Hora do Senhor, Hora de
manifestar sua glória na paixão e ressurreição, é misteriosamente antecipada: “A
minha Hora ainda não chegou!” Quem pode mudar a Hora de Deus? Ninguém! E,
no entanto, misteriosamente, sem pedir nada, sem exigir nada (ela é a Serva e
uma serva não tem direitos, não exige nada!), ela antecipa a Hora! Pela sua atitude
de amor, de confiança, de humildade, misteriosamente a Hora do Cristo faz-se
misteriosamente em Caná e traz o vinho do Espírito, o bom vinho da alegria,
sinal do Reino de Deus. Mas, isso somente é possível porque quando chegar a
Hora (cf. Jo 17,1), a Mãe de Jesus estará lá, ao pé da cruz (cf. Jo 19,25).
Então, somente é possível a intercessão em Cristo quando se estar disposto a
levar a cruz com Cristo, permanecendo com ele na sua Hora, na Hora da cruz.
Fora disso nenhuma intercessão é possível, nenhuma é válida, nenhuma é em
Cristo! Não poderá nunca participar da manifestação da glória de Cristo não
está disposto a participar da hora da paixão do Cristo!