Leitura: Mt 27,32; Mc 15,20b-22; Lc
23,26-32; Jo 19,16b
Neste quarto mistério, tomemos três
pontos para orientar nossa contemplação.
Primeiro. O caminho do Calvário não é
somente a parte final do longo caminho de Jesus, mas é o cume de toda uma
existência. Se olharmos com atenção os três evangelhos sinóticos (Mateus,
Marcos e Lucas), veremos que eles narram todo o ministério público de Jesus como
uma subida a Jerusalém. O Senhor vai caminho para a Cidade Santa, onde sofrerá,
morrerá e ressuscitará e, no caminho - ele na frente e os discípulos atrás -,
vai dizendo: “Se alguém quiser ser meu discípulo, renuncie-se, tome sua cruz
e siga-me...” (Mc 8,34) Pois bem, ser cristãos, ser discípulo é deixar-se,
renunciar-se e seguir Jesus no seu caminho... E seu caminho passa
necessariamente pela cruz para chegar, depois, à glória da ressurreição...
Assim, este último trecho do caminho do Senhor é um convite para que nós o
sigamos no caminho da nossa vida com a nossa cruz. A cruz é nossa, o caminho é
dele. Mais ainda: ele mesmo é o caminho, o nosso único caminho que conduz à
vida! É impossível ser cristãos sem a disponibilidade de se deixar e seguir o
Senhor. Seria uma tremenda ilusão que daria em nada! Portanto, coloquemo-nos
nós, como fruto deste mistério, numa sincera disponibilidade em seguir o
Senhor, deixando-nos guiar por ele, ainda que seu caminho não seja fácil. Nunca
esqueçamos: nosso destino último não é a cruz, mas a ressurreição!
Segundo. Que significa levar a cruz?
Significa enfrentar com paciência, coragem e retidão de consciência os
desafios, as limitações e tensões da vida. A cruz é tudo quanto nos acabrunha,
nos faz sofrer, nos coloca em crise. Levar a cruz significa ter um olhar
contemplativo, uma capacidade de ver por trás das aparências, tendo a
capacidade de enxergar nos sofrimentos e desafios a presença do Senhor, que nos
chama a segui-lo numa atitude de confiança, de amor e de doação. O cristão não
deseja a cruz da vida, mas sabe suportá-la em união com o seu Senhor, dando-lhe
um sentido salvífico – “Eu completo na minha carne o que faltou dos
sofrimentos de Cristo...” (Cl 1,24) e, assim, encontrando força e coragem
para vencer! A vitória, mais que exterior, é interior: ainda que as situações
que nos contrariam e afligem não sejam superadas, nós encontramos força para
enfrentá-las sem perder a paz e sem desandar no rumo da vida! É assim: quando
Deus não acalma a tempestade dá fortaleza ao barco para não se desmanchar nem
soçobrar! Então, levar a cruz não significa de modo algum alimentar sentimentos
derrotistas, negativos, de uma conformidade passiva e sem iniciativa diante dos
desafios da vida. Significa, ao invés, enfrentar a realidade adversa confiando
no Senhor, com paciência, com espírito de abandono em suas mãos benditas,
encontrando aí força e inspiração para superar as dificuldades e ir adiante,
aconteça o que acontecer!
Terceiro. No caminho do Calvário, não
esqueçamos o Cirineu. Ele nos representa. Sua participação no caminho da cruz
significa que devemos “ajudar” Jesus a levar sua cruz. Como? “Cada vez que o
fizestes a um desses meus irmãos mais pequeninos, a mim o fizestes” (Mt 25,40).
Somos, portanto, chamados a ser cirineus para Jesus presente em cada irmão
necessitado de nosso socorro, de nossa compaixão, de nossa solidariedade. Uma
contemplação da paixão dAquele que morreu por todos que não nos conduza à
“com-paixão” pelos que o representam, aqueles nos quais ele mesmo disse que estará
sempre presente, não nos serviria para nada! Então, que a meditação da Paixão
nos abra à compaixão para com o Senhor Jesus presente no irmão necessitado!